quinta-feira, 26 de agosto de 2010

QUESTÃO DE LIMITE - ARTIGO DO O GLOBO

Qual será a sociedade do futuro se hoje os pais não construírem limites para seus filhos? Talvez uma sociedade de adultos despreparados para as incertezas da vida e sem consciência de que o mundo não gira em torno deles. Mas qual a saída para ajudar pais e responsáveis nessa difícil missão de educar crianças cada vez mais conectadas pela tecnologia a diferentes realidades e estímulos? Existem inúmeros caminhos de suporte educacional distantes da maioria da população, mas, ao propor a Lei da Palmada ao Congresso Nacional, proibindo o uso de castigos corporais sem dar às famílias subsídios para adotarem um comportamento diferenciado na hora de impor limites às suas crianças, o governo está apenas criando mais um assunto para as rodas de psicólogos e especialistas no tema.

Muitos pais na infância viveram a rotina da palmada para aprender o que não “deve ser feito”, desconhecendo outras soluções educativas. Se não viveram essa rotina na infância, para muitos a palmada é apenas o reflexo da falta de paciência para optar pelo caminho do diálogo, situação muito comum nos dias de hoje, em que a maioria dos pais trabalha fora e passa grande parte do tempo longe de casa. Muitos, inclusive, exatamente por estarem ausentes quase em tempo integral, se sentem culpados por isso e preferem até mesmo não impor limite algum.

Paralelamente, uma lei desse tipo gera outras situações controversas. A falta de informação sobre as regras que estabelece pode, amanhã ou depois, levar um filho a agredir um pai e achar-se no direito de ameaçá-lo de denúncia se ele retrucar.

Por outro lado, o que um pai considera como “palmada”, para outro pode ser considerado uma agressão mais violenta, e vice-versa. Cada um tem uma concepção diferente. Não dá para colocar a questão da educação e da saúde da criança e do adolescente “num mesmo saco”. Além disso, é utópico imaginar que uma lei dessa natureza conseguirá interferir na rotina pré-estabelecida das famílias.

Prática corriqueira na educação do passado, a partir do fim do século XX a punição física passa a ser mal vista por psicólogos e profissionais da educação, assim como qualquer castigo físico direcionado às crianças. É a partir da década de 80 que começam a surgir os primeiros programas específicos para atendimento dessa problemática e, em 1990, é criado o Estatuto da Criança e do Adolescente.

Seja qual for o caminho pedagógico ou psicológico adotado, uma coisa é certa: criança precisa de limites.

Mas um limite saudável. E, muitas vezes, dar uma palmada significa meramente aplicar um castigo, e não impor o limite efetivamente.

É preciso levar a público, de forma massificada, que existem formas saudáveis de se impor esses limites, seja através de campanhas educativas, realização de terapias direcionadas em unidades públicas voltadas para as famílias ou interferências dos poderes públicos nas políticas de ensino e pedagógicas. É possível construir uma sociedade sem violência doméstica e com cidadãos mais bem preparados para a vida. Mas, assim como educar, isso dá um baita trabalho.

Luciana de La Pena

terça-feira, 24 de agosto de 2010

“Eu vivo por ele! “: amor ou dependência afetiva?

Muitas pessoas procuram psicólogos por problemas afetivos, seja por que amam demais, seja por que amam de menos. Com o tempo, escarafunchando suas queixas, percebemos que, muitos desses que dizem que amam, no fundo, dependem afetivamente de outra pessoa. Mesmo em situações onde a dependência patológica é clara, a pessoa não consegue se livrar daquele relacionamento, pois se sente totalmente presa a ele.
No livro “Amar ou depender”, Walter Riso, um terapeuta que atua na Colômbia, compara os dependentes afetivos aos drogadictos ou viciados. “O vício afetivo tem as características de qualquer outra adição, mas com certas peculiaridades.” Quando uma paciente chega a seu consultório e lhe pede para ajudá-la a deixar de amar aquele homem que a maltrata tanto, Walter Riso responde que isso é impossível. Não podemos esperar deixar de amar e, sim, desenvolver nossa autoestima, autorrespeito e controle emocional para nos fortalecermos e percebermos que o que sentimos não é amor e sim dependência afetiva. “O viciado deve deixar de consumir, mesmo que seu organismo não queira fazê-lo.”

Quando perguntadas sobre o que seria uma boa relação amorosa, a maioria das pessoas responderia que é aquela baseada no amor. Porém, somente o amor não basta para a construção de uma relação saudável, é preciso respeito, sinceridade, comunicação clara, afinidade de gostos, etc. O que adianta o amor em sua forma pura? A vida é bem mais real do que isso! Desconfiemos daquelas pessoas que falam em alto e bom tom coisas tipo: “Vivo por ele e para ele”, “Ela é tudo para mim”, “Ele é a coisa mais importante da minha vida”, “Não sei o que faria sem ela”, “Se ele me faltasse, eu me mataria” e tantas outras ...

Segundo Walter, o diagnóstico da dependência está baseado nos seguintes pontos:

1. A dependência só aumenta com o decorrer do tempo, apesar dos maus tratos;
2. A ausência do parceiro causa enorme sofrimento;
3. Há o desejo de deixar o outro, mas as tentativas são em vão;
4. Grande investimento de tempo e esforço para poder estar com o outro;
5. Redução de seu desenvolvimento familiar, social e profissional.

Várias são as causas da dependência afetiva: imaturidade emocional, baixa autoestima, baixa tolerância ao sofrimento, à frustração, medo do abandono, etc. Ao invés de só buscar as causas, é importante perceber se aquela relação me faz crescer como pessoa e ao outro também. É preciso escutar os sinais do mundo, amigos e parentes sempre dão sinalizações de como estamos. É preciso que fiquemos atentos. E quando o sofrimento for maior do que a alegria numa relação amorosa, procure ajuda profissional, pois certamente esse padrão de relacionamento vem se repetindo há algum tempo em sua vida!

Termino com um texto do próprio Walter:

“A convivência não é um panaceia, mas tampouco é infelicidade total. O amor é um processo em ebulição permanente, vivo e ativo, no qual traçamos a cada instante nosso ecossistema afetivo, nosso lugar no mundo. É a operação pela qual nos adaptamos ao outro, sem deixarmos de ser nós mesmos. Podemos nos encaixar sem nos violentar, nos adaptarmos devagar e com ternura, como quem não quer ferir nem ser ferido. E essa união maravilhosa de ser dois que parecem um somente é possível compaixão e sem dependência afetiva.” (pp163)

quarta-feira, 18 de agosto de 2010

ALIENAÇÃO PARENTAL




O psiquiatra Richard Gardner, em 1985, denominou como síndrome da alienação parental, o processo que consiste em programar uma criança para que odeie o genitor sem qualquer justificativa. Trata-se de uma verdadeira campanha para desmoralizar o genitor. O filho é utilizado como instrumento de agressividade direcionada ao parceiro. A criança que ama o seu genitor é levada a afastar-se dele, que também a ama, gerando contradição de sentimentos e destruição do vínculo entre ambos.

Os casos mais frequentes da síndrome de alienação parental estão associados a fatores e situações onde a ruptura da vida conjugal gera em um dos pais uma tendência vingativa muito grande contra o outro parceiro. Quando um dos genitores não consegue elaborar adequadamente o luto da separação, desencadeia um processo de destruição, vingança, desmoralização e descrédito contra o outro. Para compreender psicologicamente o que ocorre nesta síndrome, é necessário entender o que ocorre no momento anterior ao processo de separação conjugal.

Para Féres-Carneiro (1998), na situação de separação, o pior conflito que os filhos podem vivenciar, é o “conflito de lealdade exclusiva” quando exigida por um ou ambos os pais. No momento do divórcio, alguns casais não conseguem distinguir com clareza a função conjugal e a função parental. Esse é um dos maiores problemas para os filhos, pois produz uma grande confusão.

É necessário que homens e mulheres, quando separados, lembrem-se que continuam em suas funções de pai e mãe. A família é constituída de vários subsistemas, entre eles, o conjugal e o parental. Quando um casal se separa, o holon conjugal desfaz-se, porém o parental continua em novo formato. É preciso que pais e mães cuidem e preservem a saúde mental de seus filhos e entendam que o vinculo com o outro genitor é extremamente importante para a vida de seus filhos.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

A dislexia emocional: Deixe de ser criança!

Você é o adulto confiante e confiável que sempre achou que seria, ou a vida muitas vezes o deixa desconcertado?
Você fica frustrado porque acha que deveria ter mais controle?
Você se sente embaraçado ou infeliz quando reage de determinadas formas, mas descobre que não consegue impedir que isso aconteça?

É com essas três perguntas impactantes que Helen Kramer inicia seu livro “Deixe de ser criança”. Usando o termo dislexia emocional, ela explica como adultos podem comportar-se emocionalmente como crianças. “A dislexia emocional é um impedimento fundamental para que uma pessoa atinja uma maturidade plena. É o motivo que o leva a explodir quando deseja sentir-se calmo, a ter medo quando quer ser corajoso ou a sentir-se frustrado ao invés de bem-sucedido.”
Nosso processo de aprendizagem inicia-se quando nascemos e se dá na troca com o meio. Primeiro na troca com os pais e, principalmente, com a mãe ou quem cuida do bebê. Com o passar do tempo as trocas se dão com o meio ambiente. Porém, os bebês não sabem que suas mães vão lhe alimentar quando estão com fome, e, por isso, choram. Com o passar do tempo e desenvolvimento de sua memória, eles começam a chorar menos, porque sabem que suas mães virão com a mamadeira. Segundo a própria autora, a vida torna-se dramática por não ser ainda compreensível para uma criança. “A vida é verdadeiramente dramática para a criança devido à sua incapacidade de controlar-se e de controlar o ambiente em que vive.”
Pessoas “disléxicas emocionalmente” são aquelas que não sabem lidar com as mudanças que acontecem em suas vidas e agem como crianças. Tornam-se dependentes e impotentes e agem melodramaticamente diante de situações que requerem certo controle emocional. Todos nós podemos passar por isso. Segundo palavras da autora, ninguém é perfeitamente equilibrado todo o tempo. Muitas vezes vemos pessoas bem-sucedidas em seus trabalhos e super infantilizadas dentro de casa; executivas de grandes empresas brigando com seus namorados porque ele não ligou na hora combinada, um grande médico brigando no trânsito por causa de uma “fechada”.  A maioria das pessoas têm certa área onde percebem que não tem controle e onde as respostas emocionais são infantis.
É preciso que conheçamos aonde somos frágeis, já que certas situações sempre se repetem.  Passamos a vida repetindo as mesmas situações que nos impedem de crescer e só mudamos personagens e cenários. Crescer e virar adulto é difícil e não vem com manual. A psicoterapia nos ajuda a encarar nosso medos, ampliar nosso recursos e assumir quem queremos ser, independente do que dizem que é o certo. “Em nossa sociedade, estamos constantemente transformando seres humanos comuns em heróis e ficando desapontados quando não correspondem às nossas expectativas (...) Ficamos zangados quando nossos heróis nos decepcionam, porque estamos procurando modelos de poder baseados em nossas percepções infantis.”
Acalme-se: você é apenas um ser humano!

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Por uma nova paternidade

Inspiradas pelo Dia dos Pais e pela volta às aulas das crianças, depois de um período de férias, gostaríamos de destacar a importância da figura paterna na educação dos filhos. Devido às mudanças dos últimos tempos, os homens têm dividido, cada vez mais, as tarefas domésticas com suas esposas, já que ambos trabalham fora. Essa mudança no cenário caseiro vem exigindo uma redefinição de papéis, principalmente o paterno. Várias funções, antes femininas, têm sido repassadas aos homens, principalmente em relação aos cuidados com os filhos (Jablonski, 1999).
Porém, ainda é grande a ausência paterna. Ela é muito estudada quando se dá o divórcio, na medida em que há significativo afastamento entre pai e filho, mas também nos casos de pais que moram na mesma casa de seus filhos. Eles ainda são dispersos quando se trata das atividades escolares, culturais e de lazer de seus rebentos. Ainda é a mãe a grande figura presente na vida dos filhos.
Pesquisas (Lamb, 1997; Black, Dubowitz&Starr, 1999; Marshall, English&Stewart, 2001) demonstram que pais que acompanham o desempenho acadêmico dos filhos promovem um melhor rendimento dos mesmos. Tais resultados demonstram a importância do pai para o desenvolvimento escolar dos filhos e apontam para a necessidade de educar os homens para conhecerem as muitas ações que podem melhorar seu desempenho enquanto pais.
É preciso diálogo e participação na vida do filho. Participação quer dizer mostrar interesse, perguntar sobre o dia do filho, auxiliá-lo, tirar suas dúvidas, etc. Foi verificado que crianças com melhor desempenho escolar têm mais apoios em casa além do apoio da mãe.
Devemos chamar atenção não só para as famílias, mas também para as escolas, que têm papel fundamental em alertar os pais “homens” de sua importância no desempenho afetivo, social e acadêmico de seus filhos. Uma nova paternidade se anuncia, com um pai não só provedor, mas um pai participativo, interessado e amoroso.